Você Pergunta: Em uma de suas cartas o apóstolo João fala algo que me deixa intrigado: pecado para morte e pecado não para morte. Por uma pessoa que comete um deles ele manda orar, por outra que comete o outro, não. Gostaria de entender melhor esse tipo de pecado “não para morte”, qual seria? Já ouvi falarem que seria adultério, seria isso verdade?
Caro leitor, de fato, essa fala do apóstolo João precisa ser analisada com detalhes para que uma compreensão correta aconteça. Muitos falam por aí o que o texto não diz como, por exemplo, que esse pecado “para morte” seria adultério ou algum outro pecado visto como muito grave. Vamos ver agora do que se trata?
(1) No presente contexto, o apóstolo João caminha para a finalização de sua primeira carta. Ele fecha essa carta falando sobre como os servos de Deus devem ter em mente que são salvos porque creem no nome de Jesus (1 João 5:13). Na sequência ele fala sobre a confiança de orarmos a Deus, de pedirmos coisas em Seu nome e Ele, pela Sua vontade, nos ouvir. Se temos essa confiança sabemos que recebemos do Senhor as nossas petições (1 João 5:14-15). Na sequência ele irá falar sobre a importância de orarmos pelo próximo quando está em uma vida pecado.
(2) É agora que entra o verso de nossa análise: “Se alguém vir a seu irmão cometer pecado não para morte, pedirá, e Deus lhe dará vida, aos que não pecam para morte. Há pecado para morte, e por esse não digo que rogue” (1 João 5:16). Observe que João, aparentemente, não está falando inicialmente sobre ímpios, mas sobre “irmãos” (Se alguém vir a seu irmão…). Isso parece indicar que ele está falando de pessoas que se professam servas de Deus (crentes) e mesmo assim têm sido surpreendidas em vidas de pecado. A primeira orientação é que seja analisado como essa pessoa está lidando com esse pecado. Pecado “não para morte” pode indicar a forma como essa pessoa está lidando com o erro e o tipo de erro. Se existe coração arrependido, se existe consciência do caminho errado, de que precisa de mudança, então, devemos orar para que Deus a ajude a vencer o comportamento errado. Certamente a grande maioria de crentes que erram o alvo se enquadram nesse ponto. Porém, alguns questionam como João chama essas pessoas de “irmãos” se elas não tem “vida”, se precisam de vida? Isso leva muitos teólogos a também pensar que João pode estar usando o termo “irmão” de forma mais genérica, para pessoas que faziam parte da comunidade, que estavam ali, porém, não ainda com uma vida transformada por Jesus. Seja como for, os leitores de João sabiam exatamente que deveriam interceder por esse primeiro tipo de pessoas que viviam esse primeiro “tipo de pecado”.
(3) João fala ainda de “pecado para morte”. Nesse segundo trecho, observe que ele não usa a palavra “irmão”. Apenas fala de forma direta sobre como deve ser a postura dos crentes diante das pessoas que o comete. Esse trecho é (e já foi) muito mal compreendido por muitos. Infelizmente alguns já criaram até mesmo listas de pecados que seriam veniais (dignos de perdão) e outros “mortais” e os chamaram de pecados capitais (os famosos 7 pecados capitais), fazendo diferenciação de tipos de pecados mais “aceitos” e outros “menos aceitos”, porém, não é disso que o texto está falando, pois, se fosse, João teria exemplificado, e mais: a Bíblia coloca todo tipo de pecado como uma ofensa a Deus! Sendo assim, ao meu ver, temos pelo menos duas outras possibilidades interpretativas mais aceitas para “pecado para morte”:
(i) A forma como a pessoa lida com o pecado que comete. Se não existe coração arrependido, consciência de que está trilhando um caminho errado, se não existe uma visão correta de que precisa de mudança, essa pessoa se enquadra em um quadro de alguém que está morta nos seus delitos e pecados, ou seja, nunca foi de verdade um crente (apesar de ter estado em meio aos crentes em alguns momentos). João enxerga que nesse tipo de situação não adianta orarmos, pois a pessoa, de caso pensado, está longe do Senhor e quer permanecer assim, rejeitando tudo que viu e ouviu em sua vida. João deu um bom exemplo disso, quando disse: “Eles saíram de nosso meio; entretanto, não eram dos nossos; porque, se tivessem sido dos nossos, teriam permanecido conosco; todavia, eles se foram para que ficasse manifesto que nenhum deles é dos nossos” (1 João 2:19).
(ii) A blasfêmia contra o Espírito Santo. Alguns ainda pontuam que esse pecado “para morte” seria aquele que Jesus citou em Mateus 12:31-32, ou seja, a blasfêmia contra o Espírito Santo, o pecado chamado por Jesus de imperdoável. Ao meu ver isso também explicaria o fato de João desencorajar orar para esse tipo de pessoa, já que ela estaria debaixo de uma atitude de não arrependimento e, agindo claramente dessa forma, nunca chegaria a ter perdão, pois não se arrepende. Essa parece ser a opção que melhor se enquadra em todo o contexto. Se João de fato está pensando nesse pecado imperdoável, então, ele tem por certo que não adiantaria orar por uma pessoa que estivesse nesse tipo de condição de vida, pois o que ora não alcançaria um “sim” de Deus.
(4) Por fim, é importante pontuar que os leitores de João certamente tinham maiores detalhamentos do que temos hoje para entender com mais profundidade esse “pecado para morte”. Observe que João não proíbe de orar por uma pessoa assim, apenas mostra que seria uma oração sem eficácia, pois a resposta a ela já era clara e certa. Isso me leva a pensar (de modo prático) que se hoje em dia tivermos dúvidas sobre o tipo de pecado de uma pessoa (se é para morte ou não para morte) devemos sim orar por ela. É melhor errar por excesso de zelo do que por omissão. Deus saberá dar o “sim” ou o “não” diante de nossos pedidos.