Você Pergunta: Eu estou estudando as cartas de Coríntios e em uma das citações Paulo diz que a loucura de Deus é mais sábia do que os homens. Eu não entendi muito bem isso. Como Deus pode ter algo de louco Nele sendo que Ele é perfeito? Seria algum problema de tradução errada nessa parte? Pode me ajudar a entender que loucura é essa que Paulo atribui a Deus?
Caro leitor, a confusão que muitas vezes é feita diante desse texto é porque muitas vezes ele é considerado de forma isolada, sem um estudo mais detalhado de seu contexto. O estudo do contexto se faz muito necessário para compreender o significado, o que faremos agora.
(1) O texto onde Paulo menciona essa questão da loucura de Deus e também a fraqueza de Deus é 1 Coríntios 1:25: “Porque a loucura de Deus é mais sábia do que os homens; e a fraqueza de Deus é mais forte do que os homens”. Para entender esse trecho, precisamos compreender alguns trechos anteriores. Paulo está discorrendo aqui sobre a mensagem da cruz, ou seja, sobre Jesus Cristo, o salvador, que foi crucificado para nos salvar, o evangelho da salvação. Essa mensagem era considerada por muitos como uma grande loucura, algo “sem pé nem cabeça”: “Certamente, a palavra da cruz é loucura para os que se perdem, mas para nós, que somos salvos, poder de Deus” (1 Coríntios 1:18).
(2) Toda a obra feita por Deus através da morte de Cristo confundiu aquilo que os homens julgavam que Deus deveria fazer. Os homens queriam ditar como Deus faria a Sua obra, mas Deus a fez (e a faz) conforme Ele quer, demonstrando o quão frágil é a sabedoria humana: “Onde está o sábio? Onde, o escriba? Onde, o inquiridor deste século? Porventura, não tornou Deus louca a sabedoria do mundo?” (1 Coríntios 1:20). A forma como Deus veio ao mundo por meio de Cristo, a forma como foi morto, crucificado e ressuscitado, para muitos, era algo irreal e não poderia de forma alguma representar Deus fazendo algo ao ser humano. É por isso que tanto judeus como não judeus, quando recebiam a pregação da palavra (evangelho), queriam receber sinais que os satisfizessem: “Porque tanto os judeus pedem sinais, como os gregos buscam sabedoria” (1 Coríntios 1:22). Judeus queriam sinais milagrosos que eles pudessem identificar e aceitar. Gregos (não judeus) queriam que o evangelho fosse provado por meio da lógica e do conhecimento que eles tanto amavam.
(3) Mas segundo Paulo relata, o maior sinal de todos que já havia sido apresentado entre eles era a pregação da obra poderosa feita por Jesus Cristo na cruz para trazer salvação a todo que crê: “mas nós pregamos a Cristo crucificado, escândalo para os judeus, loucura para os gentios; mas para os que foram chamados, tanto judeus como gregos, pregamos a Cristo, poder de Deus e sabedoria de Deus” (1 Coríntios 1:23-24). Apesar dessa grande obra feita por Deus ser apresentada tanto a judeus como a não judeus, ambos a viam com crítica. Judeus viam-na como um escândalo (pois não aceitavam que o messias pudesse morrer em uma cruz) e os não judeus, ou seja, os gregos aqui mencionados, se apoiavam no seu saber e para muitos deles essa história era uma grande loucura!
(4) Agora chegamos no tema da loucura de Deus. Essa loucura de Deus que Paulo cita poderíamos entender como um “apelido” que esses perdidos dão a obra feita por Deus. Ou seja, para judeus e gregos (os que não criam) o evangelho da forma como Deus fez era uma loucura. É aqui que Paulo os ironiza. Se eles chamam a obra feita por Deus de loucura, logo, essa “loucura” de Deus, ainda assim, é muito maior e mais sábia que os pensamentos humanos, pois os homens, de forma alguma, têm sabedoria e poder suficientes para salvar-se a si mesmos.
(5) Paulo ainda fala sobre a fraqueza de Deus: “Porque a loucura de Deus é mais sábia do que os homens; e a fraqueza de Deus é mais forte do que os homens” (1 Coríntios 1:25). Aqui temos a mesma construção: os homens perdidos apelidaram a obra feita na cruz de “fraqueza”, já que não aceitavam que Deus pudesse morrer em uma cruz para salvar o homem. Então, essa “fraqueza”, ironiza Paulo, é muito mais forte que a força dos homens, já que sozinhos estão totalmente perdidos!
(6) Assim, conseguimos perceber nesse texto o quão importante é se atentar ao seu contexto (versículos que vieram antes dele) para que consigamos ter uma visão correta daquilo que Paulo chama de “loucura de Deus” e de “fraqueza de Deus”. De modo algum temos Deus sendo considerado fraco ou louco por Paulo. Pelos perdidos, sim, por esses Deus era considerado louco e fraco caso realmente tivesse morrido em uma cruz para trazer salvação! Mas a forma como Paulo combate as ideias erradas de judeus e não judeus sobre a mensagem do evangelho é incrivelmente poderosa em argumentos, capaz de demonstrar o quão perdidos eles estavam e continuariam estando caso se mantivessem nesse pensamento!